Matheus Pereira, antigo jogador do Sporting e Desportivo de Chaves, revelou, esta sexta-feira, que pensou suicidar-se por duas vezes enquanto estava emprestado pelo Al Hilal ao Al Wahda, dos Emirados Árabes Unidos.

"As pessoas podem dizer que hoje eu estou bem. Sim, eu estou. Ou que estou melhor. Melhor do que antes, sem dúvida. Mas sofri bastante até me recuperar. É difícil para os outros entenderem porque ninguém está dentro de mim. E, sinceramente, eu não faço ideia de como as coisas chegaram ao ponto de eu desejar me jogar do 19° andar de um hotel em Abu Dhabi", são palavras fortes as que começam o texto do extremo no 'The Players Tribune'.

"Acho que quase tudo passa pelo futebol, não sei. Os meus vazios, as coisas que eu fazia para preenchê-los, a minha queda, minha salvação… Salvações, na verdade, porque o futebol me salvou várias vezes", prosseguiu.

"Para mim, tudo era escuridão e desespero. Eu estava cansado de lutar, estava cansado de ficar cansado. Eu queria livrar-me de tanto sofrimento que eu nem entendia de onde vinha. Havia noites que eu bebia três garrafas de vinho. Treinei bêbado várias vezes e fiquei outras tantas internado no hospital com hipocaliemia, a tomar soro para tratar a falta de potássio no sangue, porque eu não me alimentava, só ingeria álcool", acabou por revelar.

São fortes as palavras do extremo de 27 anos que abriu o livro sobre a primeira vez que tentou se suicidar no apartamento que ficava no 19.º andar: "Um dia eu abri a janela do nosso apartamento, com uma vista espetacular, e só não me mandei porque a minha esposa foi mais rápida. Ela agarrou-me, puxou-me para dentro e ficámos muito tempo a chorar abraçados ali no chão da sala, sabendo que não era o fim, nem o meu, nem o do meu sofrimento".

"Chegares a um estado de degradação mental em que te anulas ao ponto de desejares morrer é um processo violento e complicado de se sair. Traz-te muita dor a ti, a quem tu amas e àqueles que te amam. Ninguém sai disso sozinho. É preciso pedir ajuda e acreditar nas palavras do Luís Castro: 'Sempre haverá estrelas iluminando o céu'. Eu sei que não é fácil, mas, por favor, acreditem e peçam ajuda. A vida não desiste de nós, ela insiste", afirmou o jogador que aproveitou para deixar uma mensagem a quem esteja a passar por situações semelhantes.

Matheus Pereira revelou ainda que apesar de fazer terapia quatro vezes por semana, voltou a tentar cometer suicídio: "Eu peguei na chave do carro e saí a correr. Não me importava o destino, desde que ele fosse o fim. Depois toca o meu telemóvel, era minha irmã mais nova. Já atendi a chorar. [Disse] 'Eu não aguento mais, eu não aguento mais, eu não aguento mais. Ajuda-me, pelo amor de Deus! Eu quero matar-me. Eu preciso de me matar'. Ela ligou-me para partilhar comigo a notícia mais feliz da vida dela: ia ser mãe... Nós conversámos bastante, a minha irmã disse que o bebé iria precisar de um tio craque que lhe ensinasse a ele ou a ela a jogar à bola. Isso comoveu-me muito e trouxe-me uma felicidade momentânea, que não foi suficiente para silenciar aquele impulso de morte na minha cabeça", recordou.

"Assim que desliguei o telemóvel, desejei ir à ponte Hudariyat [em Abu Dhabi]. 'E se eu me mandar dali? É isso. Vou mandar-me dessa ponte. Pronto. Acabou'. Arranquei e o carro não pegou. Tentei de novo. Nada. Passei uns 10 minutos a tentar fazer o carro funcionar e não conseguia. Insisti de todas as formas, mas não pegava. Parecia que tinha algo a travar-me. Até que minha esposa aparece, abre a porta do carro e dá-me um abraço", acrescentou.

Atualmente, ao serviço do Cruzeiro, Matheus Pereira conclui a sua história de superação admitindo que se reconhece de novo: "No alívio de não precisar mais esconder tudo o que passei, no reencontro com a paixão de menino onde ela sempre esteve e, principalmente, no Mineirão cheio de cruzeirenses em noite de céu estrelado, onde me enxergo sóbrio, inteiro e feliz para cumprir a minha promessa".